sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O rádio de pilha

Poucas coisas são mais bucólicas que o som de um rádio de pilhas passando ao longe. Aquele ruído de rádio AM, tão distante de nossos dias onde os mp3 imperam.
Ontem à noitinha alguém passou em frente à casa onde moro com um rádio desses.
Ouvi o som e imaginei em uma velha barra circular da Monark, um rádio "transistorizado" amarrado no bagageiro. Cena pouco comum de se ver e ouvir nas cidades grandes e relativamente comum aqui em Colombo.
Aliás Colombo é uma espécie de memória viva de coisas que já não acontecem no dia-a-dia de Curitiba.
Crianças empinando pipas, donas de casa molhando o jardim com mangueira no final do dia e os cavalos que passam às vezes em frente de casa com o "clop-clop" das ferraduras tocando o asfalto, sem falar no boi sendo recolhido pelo dono, britanicamente no mesmo horário, quando volto de Piraquara trazendo a Lenice para casa.
Tudo, ou quase tudo aqui, acontece em um ritmo mais lento e menos neurótico.
Lembrei da belíssima frase de Antonio Olinto, um grande batalhador do uso da bicicleta, que diz sábiamente:
"Só tem a real dimensão do tempo, aquele que segue a pé, no máximo de bicicleta, o resto é pressa".
O mundo nos tira, nos dias atuais, a real dimensão do tempo. Os processadores nos computadores, a cada novo lançamento, prometem uma velocidade cada vez maior de acesso à informação. 
Essa pressa institucionalizada, nos rouba do nosso centro. Já não temos noção do que pode causar um impacto do nosso carro quando estamos a 140km/h, e assim arriscamos andar a 150 ou 160 km/h...
Recordo que quando roubaram o meu carro, fazem alguns anos, imaginei minha vida transformada num caos. Entretanto, graças à nossa capacidade de adaptação, a bicicleta preencheu perfeitamente, apenas com algumas readaptações, o lugar do carro.
Fiquei muitos meses sem andar de carro e sendo assim, a maior velocidade que vivenciava, eram os 45 a 50 km/h, conseguidos com algum esforço em descidas, na minha bicicleta. 
Um dia precisei pegar uma carona de carro e a sensação de andar a 80 km/h, dentro da cidade, foi terrivel, angustiante, apavorante...
Me dei conta do embotamento causado pela velocidade naquele dia.
Seria interessante, bastante utópico, mas absolutamente saudável propor uma inversão global de tecnologia. Por exemplo, os carros usarem motores cada vez menos potentes e os processadores cada vez mais lentos.
Talvez essa proposta absolutamente insana para os padrões atuais, nos trouxesse de volta ao contato com nossos corpos e nos fizesse novamente ouvir rádios transitorizados calmamente no final do dia, observando as nuances de cor nas folhas das árvores, provocadas pela luz do sol se pondo, criando milhares de tons diferentes de verde, que se transformam a cada segundo, num desafio invencível para qualquer placa de video.
Bom dia!

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